9 de agosto de 2013

Querido Urbano.

De livro para livro, a letra na dedicatória ia ficando mais tremida.
Havia quem se preocupasse em analisar uma tal de validade literária, e eu parada naquela primeira página quase vazia, a olhar para as tremuras, a tremer com elas.

Da primeira vez que falámos, a mão que já tremia pousou na minha. Ficámos cinco horas a conversar mas foi nesse momento que, em segredo, o meu afecto de neta tão órfã de um avô imenso fugiu para ele. Lembro-me de ver os olhos embaciados, do silêncio, da necessidade de segurar uma mão para continuar. Soube que o orgulho tinha ficado ali, circunscrito antes da pausa. E percebi pela primeira vez, com nervos e músculos, o que é a generosidade.

Na memória dessa mão trémula aprendi a materializar abstracções tão poéticas como o sentido de justiça, a lealdade ou a honestidade. E, sobretudo, a grandeza de transportar erros, culpas e tristezas acima da cabeça e nunca debaixo dos pés.

Uma vez contei-lhe como ele era um escritor especial para o meu pai. Como o tinha visto toda a vida perfilado na estante lá de casa, mais como um retrato de família do que como um livro. Por vergonha, nunca lhe disse o resto. Agora é a minha mão que treme, mas já há muito tempo que aprendi que isso não é uma fraqueza. Pelo contrário.

5 de agosto de 2013

O quê? Há mais mundo além do meu umbigo?

"Mr. Snowden, the former intelligence contractor facing legal repercussions for the release of classified information, has been ensconced in the transit zone of Moscow’s Sheremetyevo airport waiting to find out if he will be granted asylum.
His Russian lawyer earlier this week left him a shopping bag with books by Dostoyevsky, Chekhov and Nikolai Karamzin to help him learn about Russian reality."
The New York Times
Se continuam a exibir assim as vantagens de se virar costas aos EUA, correm o risco de ficar com aquilo vazio. O Roth e o Moby Dick que me perdoem.

2 de agosto de 2013

Critérios literários #1

Respeitar mais os escritores que aparecem nas paredes do Museu do Benfica.














"Desde que me tornei homem chorei a morte de três pessoas que muito amava. Todas as outras lágrimas chorei-as pelo Benfica e quase todas as minhas alegrias devo-as ao meu Clube."

26 de julho de 2013

Quando a publicidade supera a ficção.

Usar Charles Bukowski para vender whisky.
Perfeito (não fossem os cavalinhos brancos e a música épico-doce).



24 de maio de 2013

E depois não querem ter fama de nerds.

Uma noite de literatura entre as 18h30 e as 22h30?
E no fim bebe toda a gente um leite morninho, não?

Ou a boémia literária já não é mesmo nada do que era ou então a organização deste evento só conhece os hábitos nocturnos de escritores betinhos. O Mário Zambujal deve estar de coração partido.

(Eu vou na mesma. E levo pantufas.)

13 de maio de 2013

Síndrome Júlio Isidro


Padeço de complexo hipster com o Sandro William Junqueira.
Ou síndrome Júlio Isidro, que é assim mais popular e menos armado em bom.

Fico egoísta e vaidosa quando o assunto é Um Piano Para Cavalos Altos. Sempre que alguém o lê, sopro enjoada um "só agora?", naquela soberba do eu-já-curto-esta-banda-desde-o-primeiro-EP. Quando alguém não o leu, rio-me naquele tom "não percebes nada disto". Quando alguém leu e não gostou, ui.

É injusto para o Sandro, que o livro é dele. É uma atitude de merda, e com isso posso eu bem. Mas o resultado é que voto nele sempre que me pedem um voto para alguma coisa, nem que seja para administrador do prédio. Ainda bem que não há legislativas em breve, que odeio votos nulos. Lembro-me de ter pedido ao Mia Couto, na Feira do Livro, para manipular os fãs dele e empurrá-los para a fila do Sandro (mas espero que isto seja apenas uma falsa memória ou um delírio provocado pelas farturas Otário). E agora ele está numa lista de 60 finalistas de romance para o Prémio Portugal Telecom de Literatura onde só o periquito é que ficou de fora, mas eu estou tão feliz como se fosse o anúncio de um Nobel.  


30 de abril de 2013

Querido, temos de falar.

É curioso como ponho no livro uma carga masculina e depois espero dele o inverso do que normalmente espero de um homem. Meu querido: dá-me trabalho, irrita-me, não te dês assim às boas, e nunca nunca nunca me dês razão.

Só não digo "faz-me suar" porque isso já não teria nada de inverso.

(A propósito da leitura de "Em Parte Incerta", de Gillian Flynn.)

22 de abril de 2013

Muito além da tramp'urbana. Perdão: Taprobana.

"E que, pelo menos, não se fique a pensar que Taprobana é nome de avó antiga: Dona Taprobana, Ti Maria Taprobana. Não. Antes que sejam sugeridos outros delírios, é importante que fique assente: Taprobana era o antigo nome da ilha de Ceilão, metaforicamente significava o fim do mundo. Para explicação mais detalhada, é favor consultar a internet."
Excerto da versão de José Luís Peixoto de Os Lusíadas, Canto I, todas as semanas com a Visão.

Eu sou do Benfica.
Sei o que significa não esperar grande coisa de um canto.
Mas isto dá todo um novo significado à acção de não esperar grande coisa de um canto.

19 de abril de 2013

Só eu é que acho estranho haver um prémio DST?

Mas parabéns ao Jacinto Lucas Pires. Espero que este seja o único tipo de DST que ele tenha de enfrentar na vida. E eu até li (e gostei muito muito) "O Verdadeiro Actor" sem contrair nenhum tipo de doença, ardor ou comichão em zonas sensíveis.