9 de agosto de 2013

Querido Urbano.

De livro para livro, a letra na dedicatória ia ficando mais tremida.
Havia quem se preocupasse em analisar uma tal de validade literária, e eu parada naquela primeira página quase vazia, a olhar para as tremuras, a tremer com elas.

Da primeira vez que falámos, a mão que já tremia pousou na minha. Ficámos cinco horas a conversar mas foi nesse momento que, em segredo, o meu afecto de neta tão órfã de um avô imenso fugiu para ele. Lembro-me de ver os olhos embaciados, do silêncio, da necessidade de segurar uma mão para continuar. Soube que o orgulho tinha ficado ali, circunscrito antes da pausa. E percebi pela primeira vez, com nervos e músculos, o que é a generosidade.

Na memória dessa mão trémula aprendi a materializar abstracções tão poéticas como o sentido de justiça, a lealdade ou a honestidade. E, sobretudo, a grandeza de transportar erros, culpas e tristezas acima da cabeça e nunca debaixo dos pés.

Uma vez contei-lhe como ele era um escritor especial para o meu pai. Como o tinha visto toda a vida perfilado na estante lá de casa, mais como um retrato de família do que como um livro. Por vergonha, nunca lhe disse o resto. Agora é a minha mão que treme, mas já há muito tempo que aprendi que isso não é uma fraqueza. Pelo contrário.

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